segunda-feira, 13 de junho de 2011

HERMENÊUTICA ECOLÓGICA

FACULDADE BATISTA BRASILEIRA
CURSO DE BACHARELADO EM TEOLOGIA
Turma: 8º semestre 2011.1
Alunos: REGINALDO/EDMUNDO/RAFAEL
Assunto: Hermenêutica Ecológica

INTRODUÇÃO
Segundo Leonardo Boff, em seu livro ‘Saber Cuidar’, as expectativas de alterações climáticas em decorrência do aquecimento global prenunciam um futuro sombrio para o nosso planeta, com uma série de eventos calamitosos. Por toda parte já é visível os sintomas que sinalizam grandes devastações no planeta Terra e na humanidade. O projeto de crescimento material ilimitado, mundialmente integrado, sacrifica 2/3 da humanidade, extenua recursos da Terra e compromete o futuro das gerações vindouras. Encontramo-nos no limiar de bifurcações fenomenais. Boff, pergunta aos leitores do seu livro: “Qual é o limite de suportabilidade do super-organismo-Terra? Estamos rumando na direção de uma civilização do caos?”
Para Boff, a humanidade não está assistindo mais que o fim do mundo. Todos nós seres humanos estamos assistindo ao fim de um tipo de mundo, devido a uma crise civilizacional generalizada provocada pelos próprios humanos.
A preocupação é geral, em todos os segmentos da sociedade global. Haroldo Reimer em seu livro ‘Toda a Criação’, apresenta ensaios que desafiam o homem a buscar uma espiritualidade que o motive a pelo menos tentar reverter a situação caótica e dramática experimentada pela nossa ‘casa’, em termos ecológicos e ambientais, propondo uma releitura hermenêutica mais ecológica dos textos do Antigo Testamento. 

HERMENÊUTICA ECOLÓGICA: O QUE É?
Hermenêutica é um termo muito em uso na atualidade. Alguns autores até dizem que vivemos um tempo hermenêutico. O termo no sentido clássico é a “arte e ciências dos processos interpretativos”. É uma arte, que se pode ter por dom ou que se aprimora pelo cultivo. Falar de uma “hermenêutica ecológica” significa estabelecer um diálogo frutífero entre os desafios ou as demandas das crises ambientais e as projeções utópicas ou heterotópicas de futuro. O elemento fundante é a ideia de que o mundo em que vivemos é o espaço de vida que temos e que precisamos preservar. Segundo Reimer, no que tange à hermenêutica ecológica de textos bíblicos, cabe situar o sujeito interpretante como partícipe de demandas advindas de uma crise ambiental generalizada no presente.

HERMENÊUTICA ECOLÓGICA: COMO, QUANDO, ONDE E POR QUÊ?
Essas são noções que derivam de reconhecimentos das últimas três ou quatro décadas, basicamente a partir do momento em que o “mundo moderno” começou a se dar conta da finitude dos recursos naturais. A partir daí se abriu a possibilidade de analisar criticamente a própria ação coletiva dos humanos na “aldeia global”. Reimer define o termo “ecológico” como derivado da palavra ecologia. Segundo ele, esse termo tem muitas acepções particulares: “ecologia ambiental”, “ecologia social”, “ecologia mental”, etc. Mais do que conhecer cada uma dessas variantes, é importante compreender que, na sua etimologia, a palavra eco-logia é constituída por duas palavras-raízes de origem grega. A segunda parte da palavra (logia) significa “discurso”, “fala”, “estudo”, etc. A primeira parte (eco) provém da palavra grega oikós, que significa literalmente “casa”. Assim, ecologia tem a ver com a casa como espaço comum de vida. Reimer define Ecologia, como uma ciência que estuda a “casa” em suas diversas formas de organização e manifestação.

EM QUE CONSISTE?
Uma hermenêutica ecológica aplicada aos textos bíblicos consiste em buscar ler textos bíblicos em perspectiva ecológica, isto é, em sintonia com demandas e crises ambientais e com projeções de vida integral para as gerações presentes e futuras.
Falando sobre os textos bíblicos em perspectiva ecológica, Reimer afirma que “Para essa nova releitura ecológica dos textos, é necessário seguir alguns passos e um dos primeiros que necessitam passar por um prisma ecológico na leitura são os textos iniciais de Gênesis, nos quais se fala do lugar do ser humano no cosmo ou na criação. 

RELEVÂNCIA
Temos que nos dar conta de que se trata de textos pré-modernos, que podem, contudo, contribuir para a formação de uma consciência ecológica ou de uma ética ambiental. Reimer observa que nos últimos tempos, tem-se afirmado de forma cada vez mais intensa que a humanidade vive uma transição de paradigma e que na falta de conceitos mais adequados, fala-se de transição do paradigma da modernidade para a pós-modernidade. Para ele, a fragmentação da modernidade está dando lugar à visão de conjunto, que alguns chamam de ‘visão holística’. A visão antropocêntrica está dando lugar a uma compreensão de que os humanos fazem parte de um conjunto maior.

METODOLOGIA
O sujeito interpretante interroga os textos bíblicos acerca de seu potencial ecológico, isto é, se faz a pergunta a respeito de se e como os textos bíblicos revelam reconhecimentos dos antigos acerca de sua relação com o ambiente. 

 
EXEMPLOS
Há uma série de textos bíblicos que podem ser “garimpados” numa leitura em perspectiva ecológica. Um deles, claro, é o relato da criação em Gênesis. Dentro da comunidade original da criação, Deus dispôs o ser humano com tarefas de mordomo e administrador. É o mordomo que deve zelar pela vida criada. Ao ser humano foram conferidos poderes e privilégios para ‘sujeitar e dominar’, segundo o relato de Gênesis 1,28, porém isso deve ser acontecer com limites e responsabilidades. De acordo com Gênesis 2,15, a tarefa responsável do ser humano na casa é a de ‘guardar e cultivar’. Isso é uma tarefa de ‘mordomia’. Não é a “mordomia” de tirar somente vantagens. É também uma ‘mordomia’ de transformar o ambiente natural em ambiente cultural, fazer uso das potencialidades criadoras, exercitar os dons de sabedoria e de intelecto. Nisso reside uma das mais genuínas tarefas criadoras do ser humano: ser co-criador com Deus.
Entender que o mundo criado resulta de atividade de intervenção, mas que essa intervenção deve ser limitada ou balanceada por momentos ou tempos de descanso ou de “graça”, para todos os elementos da Criação.
Os tempos de pausa se destinam aos humanos, aos animais e à própria Terra (Êxodo 23, 10-12). No código da aliança (Ex 20,22-23,19), em um misto de leis que buscam mediar conflitos, há também várias leis de caráter ético-humanitário, que procuram resguardar os direitos dos fracos. Em Êxodo 23,10-11, a lei ressalta que, após um período de seis anos de intenso trabalho e de cultivo, o sétimo ano deverá ser um ano de descanso para a terra. Verifica-se então que a própria terra tem direito ao descanso.
Deve haver tempos especiais de reestruturação de relações econômicas geradoras de relações de dependência, com remissão ou perdão de dívidas impagáveis e possibilidade de reinício de vida em liberdade (Êxodo 21, 2-11; Deuteronômio 15, 12-18).
Que tal trazermos à memória um texto do livro de Deuteronômio (23, 12-15), no qual se estabelece a relação entre esgoto e santidade. Trata-se aí de um tema prosaico relativo às necessidades fisiológicas de toda pessoa. Recomenda-se que, em havendo a vida comunitária, as pessoas busquem lugares fora do acampamento para fazer suas necessidades, cavando buracos para tal. Em Dt 22,6-7 aparece um texto de caráter preservacionista ou um ‘insight ecológico’. Em Dt 20,19-20 há a preocupação com o desmatamento sem sentido. O texto se refere claramente aos prejuízos ecológicos causados pelas invasões ou por guerras. Ainda em Dt 23,13-15 há prescrições que devem ser observadas na prática do cotidiano e que tem o sujeito individual, o cidadão, como ator. Há também preocupações com a limpeza no acampamento, ou seja, os versículos provavelmente tematizam a vida dos israelitas no seu cotidiano. Para Reimer, nestes textos, já se antecipa a noção de “conscientização”, que implica em dar-se conta dos resultados das ações ou das intervenções humanas no ambiente.
Isso pode abrir a possibilidade de reorientação mais sábia e menos danosa de sua vida individual e coletiva, objetivando, assim, diminuir o peso da “pegada humana” sobre a Terra.
Um acampamento higiênico é relacionado com a presença do Sagrado, de Deus. É um texto que liga, pois, santidade com esgoto, podendo ser potencializado para ações individuais e especialmente para ações de políticas públicas preventivas e possibilitadoras de qualidade de vida.

Considerações Finais
Segundo Boff, “Cuidado todo especial merece o nosso planeta Terra. Temos unicamente ele para viver e morar. É um sistema de sistemas e superorganismo de complexo equilíbrio, urdido ao longo de milhões e milhões de anos. Por causa do assalto predador do processo industrialista dos últimos séculos esse equilíbrio está prestes a romper-se em cadeia”.
Diante dos problemas ecológicos e ambientais modernos, esse enunciado necessita de uma completa revisão e conforme Reimer deveria ser expresso nos seguintes termos: “a terra é a casa comum de todos os seres vivos e do próprio Deus e cada qual tem responsabilidades de cuidado. As religiões, a fé, a espiritualidade também devem dar a sua contribuição e pode-se dizer que têm muito a dar”.
A partir da sistematização da crise ecológica, da teologia ecológica, é possível conjecturar sobre o advento de uma ética do cuidado (cuidado com o nicho ecológico; com o outro; com os pobres marginalizados e excluídos; com a nossa alma; com nosso espírito e com Deus), como sendo fruto de uma nova espiritualidade, a espiritualidade planetária.
Deste modo, podemos concluir que a ética do cuidado é responsável por salvaguardar a Terra, compreendendo-a como um microorganismo vivo, é responsável ainda, por garantir os direitos dos seres humanos e de todas as criaturas.
Então diante dos clamores que ouvimos do nosso planeta, que sangra, geme em dores de parto e pede socorro pela profunda degradação, nós futuros teólogos devemos nos perguntar como a Teologia Contemporânea, compreendida como ciência, analisa à luz da fé, a crise ecológica pela qual vivemos?
Precisamos escutar a voz do planeta que suplica por vida, sendo assim entendemos que fazer Teologia Ecológica, a partir de uma hermenêutica ecológica dos textos bíblicos, é a ação, a capacidade de poder articular fé e história, de refletir ecologicamente a vida do nosso planeta Terra.

Referências Bibliográficas
BOFF, Leonardo. Saber Cuidar: Ética do humano – compaixão pela terra. Editora Vozes. Petrópolis. 16ª Ed. p.11-199, 1999.

REIMER, Haroldo. Toda a Criação: Bíblia e Ecologia. Editora Oikos. São Leopoldo. p.9-145, 2006.

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